Traficante preso por 720 kg de cocaína é sócio de rapper TZ da Coronel

 No dia 22 de fevereiro de 2022, a Polícia Militar (PM) prendeu o campeão sul-americano de caratê Ruan Arno com 720 kg de cocaína, em Balneário Piçarras, no litoral de Santa Catarina. Aquela droga toda, no entanto, não era dele. Seguindo o rastro do entorpecente, a Polícia Federal (PF) concluiria, mais tarde, que seu dono era Bruno Santana Silva, o “Firmeza”, traficante apontado como fornecedor do Comando Vermelho (CV).

Dono de carros de luxo e mansões, “Firmeza” era conhecido por ser um sujeito expansivo, apresentava-se como empresário, e é sócio formal do rapper TZ da Coronel, que acumula mais de seis milhões de ouvintes mensais em plataformas de streaming. O agenciamento do artista, assim como uma empresa de internet, segundo a PF, são parte de uma vida de negócios lícitos que servem de fachada para um suposto chefão do tráfico. O músico nunca foi investigado pelos crimes atribuídos ao seu sócio.

Mesmo após a prisão, “Firmeza” e o rapper mantiveram a relação de amizade. Continuaram a ser sócios na empresa que cuida da imagem do artista, batizada de Tropa da TZ. Jovem de 21 anos, Matheus de Araújo Santos, o TZ da Coronel, é um fenômeno do trap no Brasil. Tem milhões de seguidores e de ouvintes no streaming. Ele foi arrolado como testemunha de defesa na ação penal por tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e organização criminosa pela qual “Firmeza” responde. À Justiça, contou que se conheciam há anos, em razão da atuação do empresário no agenciamento de artistas, e que a empresa da qual ambos são sócios não tem qualquer envolvimento com ilícitos.

TZ afirma que o indiciamento de seu sócio Bruno Santana Silva, o “Firmeza”, não tem relação nenhuma com a atuação da empresa TZ da Coronel Produções Artísticas Ltda., que “trabalha há anos no mercado de atividades artísticas e espetáculos ao vivo, com atividade empresarial absolutamente lícita e funcionamento regular”.

“O indiciamento por parte de um de seus sócios, não possui qualquer relação com o objeto empresarial da companhia e com o desenvolvimento da carreira artística do artista TZ da Coronel, que continua a gerir normal, lícita e regularmente seus negócios empresariais”, diz a nota.

Apreensão de 720 kg e mensagens

A Operação Facção Litoral, da PF em Itajaí (SC), chegou a “Firmeza” a partir de mensagens de um dos traficantes filmados descarregando caixas de drogas no apartamento do campeão de caratê. Em conversas localizadas pela PF, esse traficante conversava com “Firmeza”, de maneira cifrada, sobre a apreensão da droga e como o depoimento do carateca poderia incriminá-los. A quebra de sigilo de mensagens de personagens do entorno dele mostrou aos investigadores uma enxurrada de mensagens sobre drogas, armas e envolvimento com o Comando Vermelho (CV).

Há material explícito sobre o que “Firmeza” pensa de si mesmo. “Sou criminoso, pô, se liga nessa porta [sic] e para de falar meras [sic]”, disse em uma conversa com a própria namorada. Mas, segundo a PF, havia uma fachada que escondia a vida no crime. De acordo com investigadores, ele era dono de uma empresa de TV a cabo e internet.

A PF não achou nada que incriminasse TZ da Coronel. O músico aparece na investigação em um encontro com outro alvo da Operação Facção Litoral, em um hotel em Itajaí, em 2022. Trata-se de Ítalo Saraiva, o “Tatá”. Em nome dele, segundo a PF, “Firmeza” tentou colocar uma lancha de R$ 700 mil, em um negócio que não deu certo.

“Tatá” foi flagrado em mensagens negociando armas e drogas por WhatsApp. Em um áudio no celular dele, diz trabalhar para o “Abelha”, apelido de Wilton Quintanilha, conhecido como o líder máximo do Comando Vermelho no Rio de Janeiro.

A relação entre “Firmeza” e TZ da Coronel também é mencionada em outro depoimento. Roney Mensch, que hoje é sócio dos donos do site de apostas PixBet, famosa por patrocinar clubes de futebol, foi alvo de buscas e apreensões na mesma operação porque mencionava a venda de armas em conversas com “Firmeza” e tinha uma das motos BMW do traficante em sua posse quando a Facção Litoral foi deflagrada.

O negócio da PixBet

Mensch disse à PF que tinha amigos em comum com “Firmeza” e que se aproximou dele depois de vê-lo empresariando TZ da Coronel em um contrato de patrocínio da PixBet ao cantor. Ele é engenheiro de computação e queria oferecer serviços ao site de apostas. Acabou dando certo. Atualmente, ele é sócio da XBank, uma empresa aberta ao lado dos dois sócios da PixBet e do advogado da empresa, Nelson Willians.

Segundo a PF, Mensch chegou a conversar com “Firmeza” sobre uma possível venda de armas. Aos investigadores, ele disse que é dono de empresas de TI e foi dono de uma loja de armas licenciado. Ele afirmou nunca ter fechado negócio com “Firmeza” para receber comissão no caso da PixBet e que a moto ficou com ele porque eram amigos à época e Bruno estava consertando um carro em uma oficina próxima de sua casa – o que acabou sendo confirmado por outras testemunhas e fazendo com que ele ficasse de lado nas investigações.

A ação penal pela qual respondem Bruno e outros acusados de tráfico de drogas está em fase de alegações finais das defesas e do Ministério Público.

“Firmeza” alega inocência e provas nulas

Os criminalistas João Pedro Barreto e Juliana França David, que defendem “Firmeza”, afirmam que Bruno Santana da Silva é reconhecidamente um empresário com atividade lícita, o que inclui a empresa de TV a cabo e internet e o agenciamento de artistas de rap, como é o caso de TZ da Coronel.

Eles relatam que o processo da Operação Facção Litoral é recheado de nulidades, principalmente no que diz respeito à interceptação de mensagens e gravações ambientais como aquela que menciona a carga de 720 kg de cocaína.

Em resposta à acusação, Barreto afirmou que o Ministério Público denunciou Bruno por tráfico com base em “ilações desconexas e imprecisas”, baseada na “interpretação dos fatos”, como mensagens de terceiros captadas durante a investigação. Segundo essa premissa, diz a defesa, qualquer um que tivesse relação com Bruno Santana deveria ser denunciado.

O advogado ainda afirma que o MP não conseguiu provar na denúncia o crime de lavagem de dinheiro porque não demonstrou o crime antecedente — ou seja, a origem criminosa do dinheiro. E que as provas dos autos não demonstram como os acusados teriam se associado para cometer crimes, o que derrubaria, em tese, o crime de organização criminosa.

Os advogados ainda afirmam que o “indiciamento” de Bruno “ocorreu com base em provas ilícitas”, que culminaram na deflagração da Operação Facção Litoral. “Além disso, salientamos que todas as empresas existem, empregando diversos funcionários e recolhendo adequadamente todos os encargos trabalhistas e tributários devidos”.

A perícia contratada pela defesa conclui que há escutas ambientais e interceptações telefônicas cujos dados não abrangem todos os dias em que valia o monitoramento, o que indica, segundo o perito, a entrega parcial de provas à Justiça pelos investigadores. Em resumo, o perito afirma que “não é possível validar a integridade e a integralidade da prova digital formada pela investigação denominada Operação Facção Litoral”.

O advogado Nelson Willians, que defende a PixBet, afirma desconhecer o caso investigado pela Operação Facção Litoral e que o XBank é uma empresa que ainda está sendo aberta e, por enquanto, em desuso.

metropoles