Cirurgia faz mulher diagnosticada com Parkinson aos 42 voltar a correr

A administradora Alessandra Meneghini tinha 42 anos e se preparava para correr uma meia maratona quando apareceram os primeiros sinais do Parkinson que a acomete. O ano era 2015 e, embora ela estivesse treinando com afinco, não conseguia melhorar os resultados. De repente, também percebeu que não conseguia mexer os braços no mesmo ritmo que corria.

Alessandra havia entrado no grupo de corrida para lidar com uma depressão e estava apaixonada pela atividade física. Contrastando com seu vigor físico e animação, ela começou a perceber uma piora em sua consciência corporal, mudanças na maneira em que escrevia e dores inesperadas no corpo.

“Desconfiei que não era só o excesso de treinos quando tive que pedir ajuda para a minha filha, que tinha apenas cinco anos, para lavar o meu cabelo. Foi aí que decidi procurar um médico”, recorda.

Parkinson precoce

Oito meses depois dos primeiros sinais, Alessandra foi diagnosticada com Parkinson precoce. O distúrbio neurológico afeta cerca de 10 milhões de pessoas no mundo e está relacionado a uma degeneração nas células produtoras de dopamina.

“Embora a ciência esteja pesquisando o Parkinson há 200 anos, a causa ainda não é clara. Sabemos que fatores genéticos estão envolvidos em alguns casos, especialmente os precoces, que têm início antes dos 50 anos de idade”, afirma a neurologista Sara Casagrande, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Ela é a médica de Alessandra.

Apesar dos tremores serem o sintoma mais conhecido da condição, eles podem ou não estar presentes. O sinal de Parkinson mais comum, na realidade, é uma lentidão dos movimentos conhecida como bradicinesia.

“O paciente tem uma mudança em sua letra, demora a abotoar uma camisa e sempre começa a se manifestar primeiro em um lado para depois aparecer no outro”, aponta a especialista.

Corpo travado

Os sintomas de Alessandra já haviam piorado quando veio do diagnóstico. Ela sentia os membros superiores “travados” e demorava muito para conseguir comer ou tomar água.

“Em 2015, ao buscar informações sobre o Parkinson, senti que havia recebido uma sentença de morte. Foquei em fazer o melhor possível pela minha saúde para pelo menos conseguir estar na festa de 15 anos da minha filha, mas não me imaginava indo muito longe”, lembra ela.

Ela também viveu um momento de negação. A administradora estava em um ótimo momento da carreira e da vida pessoal quando os sinais da doença apareceram. “Descobri que tinha uma doença sem remédio sendo que eu não era uma pessoa velha e não tinha tremores. Simplesmente, não conseguia acreditar no diagnóstico”, aponta.

A aceitação foi um processo construído aos poucos. Além dos impactos físicos da doença, ela também viveu inesperados consequências emocionais, com alguns amigos se afastando dela por não entenderem como lidar com o diagnóstico.

Para Alessandra, era mais importante ser transparente com os familiares e os amigos. “Se eu guardasse o diagnóstico em segredo, a minha dor seria maior. Mesmo falando que eu tinha a doença, as pessoas não acreditavam, não aceitavam, imagine se tivesse escondido”, lembra.

Tratamento do Parkinson

Desde seu diagnóstico, a administradora começou a fazer um tratamento com reposição de dopamina para controlar os sintomas. A dose e a forma de uso destes remédios é regulada pois eles perdem eficácia progressivamente e nem sempre são eficazes para os pacientes.

No caso de Alessandra, a doença seguiu progredindo e exigiu doses cada vez mais frequentes de remédios, que passaram a ser dadas de quatro em quatro horas. Com o decorrer do tempo, apareceu um quadro de flutuação motora, uma oscilação dos movimentos, que não é controlada por medicamentos.

Em 2023, os sintomas haviam se intensificado tanto que ela já não conseguia mais caminhar. Ela passou a tomar 10 comprimidos diferentes por dia.

Quando se chega a esta falha do tratamento de primeira linha, o paciente é indicado para processos cirúrgicos que ajudam a controlar o Parkinson. Um deles é o de estimulação cerebral profunda (DBS, em inglês), que insere eletrodos no núcleo do cérebro para liberar estímulos elétricos que modular o funcionamento dos neurônios.

Este dispositivo funciona como uma espécie de marca-passo cerebral, levando a um alívio dos sintomas. A cirurgia não é uma cura da condição, mas ajuda significativamente no controle dos sintomas. Por seus riscos de eventuais infecções e alterações inesperadas, especialmente na fala, o procedimento só é indicado depois de outras terapias terem falhado. A solução também não funciona para todos os tipos de Parkinson.

A cirurgia é feita em parte com a paciente acordada e em parte com sedação. Além dos eletrodos implantados, uma espécie de bateria é acoplada na região próxima à clavícula e ela regula, a partir de uma programação ajustada pelo médico, a quantidade de estímulos elétricos.

A vida pós-cirurgia

O procedimento em Alessandra foi um sucesso. Ela tinha o sonho de ir ao banheiro e voltar para a cama sem a ajuda de ninguém, e conseguiu realizá-lo já na primeira noite pós-cirurgia. “Logo após o implante senti como se as dores fossem tiradas de mim”, afirma.

Ela voltou a lavar louça – “Lavo hoje com tanto prazer, nem parece que um dia reclamei de fazer isso” – e reduziu a quantidade de medicação usada no mês em 72% graças à cirurgia.

O procedimento permitiu até que ela voltasse a correr. “Voltar a fazer exercícios me devolveu a autoestima. Sinto hoje que tenho minha vida de volta. Poder correr ao ar livre, sentir meus movimentos, isso me deu uma dignidade tremenda”, diz.

“Não é fácil, mas a doença sempre nos ensina. Hoje em dia há muito mais possibilidade de tratamento do que quando descobri a doença. Dá para ser feliz mesmo com Parkinson”, conclui.

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